Minhas Folhas de Relva

percepções do cotidiano em letras livres

Um outro jeito de fazer compras 12/05/2011

Filed under: Cotidiano,Cultura,Intercâmbio,London — Aline Moraes @ 10:45 PM

Eu sempre quis comprar alguma roupa em brechó. Aquela curiosidade em caçar preciosidades enquanto eu ganho uma bela rinite. Em Sampa, passei de ônibus por vários brechós aparentemente bacanas, mas nunca entrei num. A minha única experiência foi em Tupã, quando fui visitar a mãe do meu então namorado. Do salão em que se amontoavam pilhas e cestos sem muita organização, levei um colete azul (que usei duas vezes) e dois pares de brincos. Um quebrou, mas eu ainda o tenho, na esperança de consertá-lo. O outro, uso até hoje.

Meu ex-namorado sempre usou roupas usadas. A mãe dele costumava mandar de Tupã os suprimentos. Naquele dia, ele achou uma bermuda branca e uma camiseta listrada bacanas. Por R$1 cada. Se não me engano, a camiseta foi, na verdade, R$0,50! E, tempos depois, ele me deu de presente um óculos “de tiozão” do jeito que eu queria. Comprou naquele mesmo salão de coisas usadas por R$1. Tenho os óculos até hoje também. Acho até que é (ou já foi) de marca.

O Vitor era a única pessoa que eu conhecia que fazia compra de roupa em bazares como aquele. Nada vintage, como mandam os brechós bacanudos do Centro e da Zona Oeste de Sampa. Simplesmente roupas normais, usadas e baratas. Bom, ele era a única pessoa até eu vir morar em Londres.

Aqui, existe uma certa cultura de comprar nas chamadas “charity shops”. Existem centenas, milhares. Só na minha área, Walthamstow (E17), há seis cadastradas no site da Charity Retail Association. E há muitas mais, pequenininhas, menos organizadas, espalhadas. Pesquisando no site All in London, achei 13 páginas (com 80 links cada) de endereços de charity shops na cidade.

Dei um Google antes de começar a escrever esse post pra ver se achava matérias de jornal sobre o tema. Achei uma do The Independent, de Setembro de 2010, falando sobre como a crise econômica em UK deu um up nas vendas de charity shops, já que mais pessoas estavam atrás de barganhas em tempos de recessão. E mais outras duas matérias falando sobre como várias charity shops têm se transformado em lojas estilosas, mais cheirosas e organizadas, pra atrair clientes. Os moderninhos londrinos (sobretudo os chamados “Dickheads” rsrs) devem adorar garimpar em busca de produtos de marca usados por preços beeeem mais acessíveis. Aaah… os tais brechós… Já entrei em alguns por Brick Lane e Liverpool Street que são super cool! Música ambiente, gente interessante e um monte de coisas bacanas que eu jamais usaria. Valeu como sightseeing 😉

Num outro dia, menos glamoroso, resolvi ir à caça de charity shops. O inverno tinha chegado e os casacos que eu trouxera do Brasil só tinham me aquecido até o outono. Antes de vir pra cá, já haviam me recomendado comprar casacos de inverno de segunda mão, por conta do preço (e já que eu iria usá-los só uma vez). Portanto, tentei. Anotei uma lista com umas cinco charity shops em East London e fui, no meu dia de folga. Achei uma jaquetinha preta bonitinha por £3. Comprei. Até achei um casaco longo e quentinho por £5, mas era tamanho 8, muito pequeno pra mim (aqui eu sou 10 ou 12). Cacei, cacei e cacei e percebi o quão difícil é achar coisas quando você de fato precisa delas. Ainda mais quando você é um size 10 ou 12, como toda a “mulher média”.

Comprei mais algumas coisas naquele dia, camisetas, cinto, bolsas… Mas não fui muito bem sucedida na minha primeira investida. O meu casaco de inverno eu achei bastante tempo depois, por £18, numa loja em Walthamstow Hight Street. Um achado mesmo, pelo preço e pelo grau de aquecimento proporcionado. Não é de ótima qualidade, mas durou o inverno todo (e se eu pregar os botões de novo, poderei usar nas noites frias em Perdões!). E, junto com a minha “luva ursinhos carinhosos” (porque só tem espaço pro dedão e pros outros quatro dedos juntos, como a mão dos ursinhos), salvou a minha pele, literalmente. Antes de achar a luva, minha mão ficou tão ressecada de frio que rachou toda até sangrar, um horror. Ainda tenho umas marcas pra contar a história…

No fim, o lance de “comprar roupa de inverno em charity shop” não deu certo pra mim. O que funcionou foi olhar e olhar e olhar nos mercadões de rua. Achei dois casacões super bacanas por £15 e £20 em Bethnal Green que, certamente, minha mãe poderá usar, com prazer, em Sampa durante junho e julho – assim que voltar pro Brasil com a mala cheia das minhas roupas de inverno, que, graças a Deus e a São Pedro, eu não preciso mais.

Mas isso não significa que eu desisti das charity shops, não! Na verdade, eu me tornei uma . Depois de mais algumas decepções, claro. Numa outra vez, usei um dia todinho de folga pra ir a Wood Green comprar roupas e dar uma renovadinha no armário. Voltei com… nada. Fui a Primark, H&M e outras lojas no shopping de lá e, simplesmente, brochei… Minha conclusão, no fim do dia, foi de que aquela ia ao shopping me deprimiu, pois sempre fui fazer compras com a minha Mamis. Costumava ser o nosso momento mulherzinha e um break nas rotinas corridas pra gente colocar a conversa em dia e curtir a companhia uma da outra. Naquele dia, eu estava sozinha. E zanzar pelo shopping e pelas araras de roupas não fez sentido. Foi engraçado porque, no mesmo dia ou alguns dias depois, contei pra minha mãe o que aconteceu e ela me disse que o mesmo aconteceu com ela. Ela foi à José Paulino e voltou de sacola vazia… Também partilhamos o mesmo sentimento: uma deprêzinha por fazer sozinha aquilo que a gente sempre fez juntas.

A solução imediata pra suprir minha necessidade de roupas aqui e ali foi o Selbourne Walk, em Walthamstow (um shopping que não parece shopping, pequeninho, com lojas meio toscas que me lembram as lojinhas da Sabrina ou do Brás, mas onde é possível encontrar coisas legais por preços ultra módicos). E, finalmente, as charity shops. Pra ser mais precisa, uma charity shop, em Leyton, no caminho entre o trabalho, a academia, o supermercado e a minha casa.

A PDSA (The People’s Dispensary for Sick Animals) vende roupas, sapatos, acessórios, livros, DVDs, CDs e o que mais for vendável pra ajudar cães e gatos abandonados e maltratados. É uma charity shop organizada, que separa as roupas por tamanho, lava tudo antes de vender, tem etiqueta de preço personalizada e, o melhor, não cheira mal. Diferente de outras no bairro, não tem 90% de suas roupas formadas pelo vestuário islâmico (já que na região a comunidade islâmica, das mais diversas nacionalidades, é majoritária). Desculpa, mas eu não estou atrás de véus, saiões compridos e blusas de senhora. A PDSA não é cool. Não é vintage. Mas dá pra achar coisas bacanas e perfeitamente usáveis para os meus padrões fashion. Por até £5. E ainda oferece oportunidade de emprego a pessoas idosas (e geralmente simpáticas), o que, pra mim, é um “plus a mais” (não, eu não acho exploração… Quem tem avós ativos como eu sabe o quanto é valioso pra eles se sentir útil mesmo passando dos 60).

Cheguei a comprar um blazer azul marinho aparentemente novinho em folha por £1 (estava em liquidação… liquidação de charity shop é uma coisa engraçada…rs). Achei uma calça jeans bacana da Oasis (uma marca daqui, não muito cara, mas não é barata) por £4 e comprei. Uma blusa da GAP também por £4 (que não comprei, pois não era assim tããão bacana). Outro dia, gastei apenas £25 pra comprar: uma calça jeans da Next, duas camisetas, dois cintões, uma mini saia, uma jaqueta da H&M, uma camisa xadrez também da H&M – novíssima –, e uma camisa azul clara em liquidação (sim, £1). E hoje, no intervalo do trabalho (às quintas-feiras eu trabalho em duas casas, dando suporte a diferentes service users num mesmo dia), passei de novo nessa charity e achei um blazer preto super bacana por £4. Tava com grana na carteira, comprei. Sempre acabo dando uma passadinha pra ver o que chegou de “novo” por lá.

Descobri, assim, um novo prazer em fazer compras. Que não me deprime, pois é um hábito nascido aqui em Londres. E, além de tudo, me ajuda a economizar e ainda levanta uma grana pra uma boa causa (que seja pelos fracos e oprimidos animais). Como aqui eu entrei na onda da reciclagem (reciclo tudo o que dá em casa, já que temos coleta específica estabelecida e eficiente, e uso ecobags pra fazer compras no supermercado), estendi a coisa pro meu guarda roupas também. Por que não? Garimpar é uma coisa que eu adoro! Desde que não envolva cheiro de mofo (ou, pelo menos, não muito forte…).

Mas, muito em breve, vou deixar a charity shop um pouco de lado e quebrar o jejum dos shoppings e grandes magazines. É que, em cinco dias, minha Mamis chega em Londres!!! E aí vou me permitir voltar à Primark, à H&M… Não só porque eu espero ganhar uma ou outra coisinha dela (sou voluntária, né bem…rs). Mas porque sei que vai ser uma delícia passar o dia garimpando do lado de lá da força, zanzando e fofocando, depois de oito meses sem ver a minha mãe (um suplício nos primeiros meses, que eu já superei, mas a saudade não diminuiu). E, certamente, em Londres, terá um gostinho especial pra nós duas.

 

2 Responses to “Um outro jeito de fazer compras”

  1. MariPassos Says:

    Agora vc pode dizer que conheceu duas pessoas que frequentam brechós rs. Acho que eu nunca te disse mas é uma coisa que vem de família. Minha mãe ama, meu pai abominava e agora só usa roupa de marca vinda de brechó e eu preciso ir pelo menos uma vez por mês, como você disse, pra ver o que chegou de novo rs. Eu não saio contando por aí porque acho que o pessoal aqui tem um certo preconceito de roupa usada, mas garanto que ninguém nunca percebeu que eu estava com roupa usada e que eu não sei nem de quem rsrs. As roupas são ótimas, baratas, algumas de marca e com certeza não daria pra comprar tantas nesse valor. Estou tentando me controlar com essa mania. Beijo!!!

  2. franklin Says:

    Filha linda. não tem como não gostar de suas histórias relatos dos seus lindos dias aí do outro lado do mundo. Estou ansioso pela sua conta. Vai ser incrível.


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