Contexto: faltando dois meses para o fim e o recomeço (que não tem começo nem fim). De Londres para o Brasil. E eu boiando no meio do Oceano Atlântico. Foi aí…
Quando, um dia, reclamei pra uma amiga que estava com “vontade de fazer nada”, ela me perguntou se eu havia perdido a “espontaneidade da vida”. Isso foi quase uma ofensa! Não dela, claro. Mas de mim pra mim mesma. Eu já estava praticamente conformada com o fato de que as despedidas devem implicar um desencantamento lento… Já havia me acontecido antes. Mas ouvir que perdi a “espontaneidade da vida” soou quase como morrer aos poucos. Não combina quando a gente sabe que viver é um renascer constante.
Bom, mas se falo em “renascer”, é porque existe um morrer no meio do processo. E, de fato, existe. Não pra Espontaneidade. Mas pro nosso “eu” de ontem, pras nossas antigas conquistas, pros ranços do passado. Morrer, nesse caso, não significa enterrar de vez. É mais um trocar de pele, mantendo o mesmo corpo pulsante e as marcas indeléveis que atravessaram a carne sob tantas e tantas peles.
Não aceito, portanto, a morte da Espontaneidade! Mas, se ela, em algum momento, de fato, se perdeu em meio às minhas despedidas inconscientes, tratei de ir ao encalço dela. Questão de honra! Não foi planejado. Ainda que sob protestos, só deixei o peito entreaberto e, assim, pude vê-la sentada na mesa de um pub e fazendo picnic no parque; espreitá-la tomando cider e dançando no jardim às 3 da manhã; jogando conversa fora numa tarde depois do trabalho e compartilhando a cozinha enquanto preparava a janta; sozinha explorando, timidamente, mas com vigor, a cidade; na companhia de um e Outro, conhecido e desconhecido.
Não deu outra: tomei a Espontaneidade pela mão e pedi que ela me acompanhasse até o último instante. Não houve protestos. Ela também estava à minha procura. “Bora, não há tempo a perder!”. E, assim, sorri o sorriso da alma, e me abasteci de vontade de fazer tudo. Ou, pelo menos, de fazer o que der, mas com vontade. Sobretudo, com vontade do Outro, mesmo que poucos; e mesmo que pelo mais breve encontro.
ge-ni-al … sua postura (e o texto).
que bom que elas está de mãos dadas com vc, de novo.
Meu Deus!… Que maravilha de texto.
Estou presenciando o nascimento de uma grande escritora.
Parabéns Aline.